null A vida secreta de quem ama o verde

Qui, 11 Fevereiro 2021 16:53

A vida secreta de quem ama o verde

O orgulho de quem fez um jardim em casa e sentiu na pele o efeito terapêutico que emana do cuidado com as plantas  


Hannah Troccoli, estudante do curso de Cinema e Audiovisual da Unifor, e amante de plantas (Foto: Arquivo pessoal)
Hannah Troccoli, estudante do curso de Cinema e Audiovisual da Unifor, e amante de plantas (Foto: Arquivo pessoal)

Em meio aos modorrentos dias de isolamento social, ela bateu o pé e convenceu a família de que era possível sim plantar uma bananeira no meio da sala de casa. E aqui não se trata de peraltice infantil.  É fato: Hannah Troccoli, 25, estudante do curso de Cinema e Audiovisual da Universidade de Fortaleza, instituição vinculada à Fundação Edson Queiroz, se apaixonou tanto pela potência de vida intrínseca ao cultivo de plantas que passou a pesquisar até sobre o que lhe parecia impossível, como, por exemplo, ter uma árvore desse porte fincada em uma batata e torná-la apta a crescer em um vaso de plástico no próprio apartamento.  

Desde criança sempre tive contato com a natureza, estimulada principalmente pelo meu pai, que passou a infância em um sítio na Serra da Meruoca e é daqueles que conhece todo tipo de passarinho e sabe o nome das plantas. Acho que ele queria que os filhos tivessem essa mesma experiência, então comprou um sítio em Guaramiranga e durante a pandemia fomos passar uma longa temporada lá. Isso me fez voltar a ver o céu e de repente me toquei que nosso apartamento, pelo menos para mim, tinha virado um dormitório apenas. Então, quando voltei para Fortaleza quis ressignificar o lugar e fui fazer isso através do cultivo de plantas”, lembra Hannah.

Leiga, passou a ler tudo o que pôde sobre o assunto antes de fazer sua primeira aquisição: “comprei uma planta chamada Chifre de Veado, uma epífita que cresce na casca das árvores sem que retire a seiva. Aí comecei a pesquisar como cuidar. E fui vendo resultado nisso, percebendo o rápido crescimento dela e como as folhas saíram bonitas. Me empolguei e fui comprando mais, trazendo do sítio, pedindo aos amigos. Assim fui construindo meu jardim ao mesmo tempo em que compartilhava meus avanços no Instagram e me aproximava de pessoas que, como eu, podem ser chamadas de planters, ou seja, apaixonadas por plantas”.

Calatéias, jibóias, costela de adão, cabeça de cavalo. E o xodó da casa no momento: a bela e cobiçada begônia maculata, “caríssima e difícil de encontrar”. Hoje, de tão central e irrefreável, a relação de Hannah com as plantas tem gerado ideias para projetos futuros. Ela sonha em abrir uma floricultura ao mesmo tempo em que pretende trabalhar com cinema e investir na docência. “Não me vejo mais sem elas. É como um pet, que caiu em minhas mãos para eu cuidar. E é muito boa a sensação de que estou conseguindo cuidar bem quando vejo ali tudo florescendo na minha frente. O sentimento é de realização mesmo e, principalmente nessa pandemia, que nos trouxe tantas perdas, ter contato com a vida em estado bruto me dá força para seguir acreditando e apostando na beleza que vem dela”, afirma Hannah.  

Para manter vivo o hobbie, Hannah sabe bem onde retirar adubo: são nas redes sociais que, sobretudo durante a pandemia da Covid-19, os “loucos por planta” têm se encontrado para exibir seus maiores orgulhos e darem pistas de como alcançar acessar, sem sair de casa,  uma espécie de felicidade clandestina que não vem só do cultivo, mas também do aprendizado sobre as plantas. Hannah confirma: “antes de me apaixonar pela begônia em si, que é realmente linda, me apaixonei pela história dela, uma nativa das matas brasileiras, de visual exótico e encantador pelo tom verde-oliva de suas folhas marcadas por bolinhas brancas, que parecem ter sido pintadas à mão, como uma verdadeira obra de arte natural. Quando li isso vi que tinha total relação inclusive com o tema do meu TCC, que é sobre um artista visual chamado Sérgio Helle que pinta o seu amor à natureza através de folhagens. Quer dizer, meu interesse por arte está diretamente ligado à musa inspiradora dos artistas de todos os tempos”, vibra Hannah.

O que é fonte de prazer não prescinde de um sentido de alerta. Hannah não esquece o dia em que seu pai precisou cortar o cacto candelabro de estimação que também crescia sem limites na sala do apartamento e enfim chegou ao limite do teto. “No corte, como ele não se protegeu como devia – geralmente nas podas é bom usar óculos, luvas, camisas de manga longa -, espirrou aquele leite tóxico bem no olho. E ele quase fica cego. A gente não sabia que era tão perigoso, mas quando fui pesquisar percebi quantos acidentes similares podem acontecer se a gente não dosar a empolgação de planter com um necessário conhecimento de causa sobre jardinagem que vai bem além de identificar se a planta é de sol ou de sombra”, adverte.  

Uma flor em forma de gente

Doze palmos de comprimento por três de largura. O mini-jardim de ervas medicinais e comestíveis da psicanalista Galeara Matos foi plantado e medido por ela com as próprias mãos e é ele quem dá as boas vindas logo à entrada do apartamento. Minúsculo aos olhos de quem passa, se faz imenso para a criadora enquanto dispositivo de prazer e ativador de memórias, abrindo caminho para as muitas formas possíveis de aprendizado e troca com tudo o que é vivo e evoca permanências em meio à turbulência fugaz dos acontecimentos cotidianos. 

 

Aqui tenho arruda, hortelã, erva cidreira, capim santo, tomilho, orégano... enfim, cabe muito neste pedacinho e a dimensão das coisas é a gente quem dá. O cuidado que me exige também é sem tamanho, porque é inevitável ter que lidar com as cochonilhas e a vida curta de algumas. E cada uma que murcha faz murchar algo dentro de mim. Mas é um pedaço de um sonho que não tem fim e nasce com a minha mãe. Eu a vi curar cinco filhos de todo tipo de doença de criança com o que trazia do quintal: era banho de arruda no tempo do sarampo ou da catapora, o chá para a dor de barriga e a náusea, tudo isso passava como mágica quando ela vinha de lá. Por isso, sempre quis perpetuar essa fonte de cura que envolve tanto afeto”, rememora.

Porque assim aprendeu e quis, Galeara vive dentro de “primaveras” que saltam pela janela e transbordam pela varanda. E sobre elas sempre há o que dizer e exibir nas redes sociais. Assim é que a hashtag “notícias do meu jardim” se multiplica para dar a ver as vedetes do momento, tal qual a flor de cera. “Já postei várias vezes sobre ela, cuja flor tem aquela textura macia, como se fosse de envernizada ou parafinada. Ela é uma suculenta linda, que gosta de ficar agarradinha às telas para fazer aquela cortina verde toda florida. Mas também tenho olhos para as paixões antigas, como o mandacaru imenso que vive no cantinho da sala e já está encostando no teto. Esse é famoso e todo mundo que chega aqui enfia a unha pra saber se é de verdade. Brinco com a vizinha de cima pedindo para furar o teto só pra ele continuar crescendo, mas ela ainda não deixou”, ri-se a jardineira cujo apelido não podia ser outro, se não “flor”.

E que todos os sentidos estejam ativos no alto da ampla e arejada morada de onde, por coincidência ou não, vê-se a Praça das Flores, um mercado de plantas a céu aberto na Aldeota. Galeara chama atenção: quando o pé de manacá e a flor de cera florescem a casa produz perfumes que o mercado especializado ainda não conhece; também as cores variadas dos antúrios e da flor do deserto jamais couberam numa só pintura impressionista; e a lenda que recobre a Árvore da Felicidade faz brotar sentimentos que a própria razão desconhece, mas se afirmam com o tempo, desenhando uma aura de bênçãos aonde chega. 

“A Árvore da Felicidade é um arbusto com duas versões: o macho e a fêmea, que, aliás, devem ser plantados juntos, em um mesmo vaso. Seria a energia Yin e Yang atraindo harmonia e prosperidade, unidas para nunca mais deixar a alegria ir embora da casa. E para que tudo isso se multiplique é aconselhável plantar duas mudas, porque assim você pode ficar com uma planta e dar a outra de presente a uma pessoa querida”, sugere a apaixonada que não se diz especialista e tem como guia uma intuição capaz de fundar, em total harmonia, vizinhanças improváveis na natureza, mas felizes no asfalto, ou melhor, na varanda, como a de um jasmineiro e uma vinagreira junto às místicas e protetoras espadas de São Jorge e Santa Bárbara. 

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Parece miragem. Quando a porta de vidro do número 1355 da rua Bárbara de Alencar destrava é com admiração e espanto que visitantes se deparam com um terreno arborizado onde pequenas casas foram erguidas para abraçar e serem abraçadas por uma diversificada família de árvores, folhagens e flores. Tudo em volta é só beleza natural e o que se ergueu no entorno como construção residencial deve respeitar os contornos do umbigo verde ali plantado pela mãe-terra. Assim entendeu e decidiu a paisagista por vocação e técnica em edificações Sandra Nascimento, proprietária do lugar e criadora do chamado Jardim da Bárbara, microcosmo cultivado por ela como um pequeno oásis em plena Aldeota.

Flamboyants em flor, um pé de pitanga, palmeira de salão, jibóias, espadas de São Jorge, papoulas, jasmins, flor do deserto, suculentas, folhagens e cactáceas à mancheia, ervas medicinais, trepadeiras engolindo cada reentrância ou tronco centenário vencido pelo tempo. “Tudo aqui foi plantado por mim e é um trabalho de anos a fio, rústico e escultural a um só tempo, fruto de muita leitura e de uma prática autodidata, mas ancorada na minha formação em edificações. Da forma como está hoje, esse jardim começa a se desenhar a partir do momento em que passo a trabalhar como produtora de plantas medicinais e ornamentais, o que me levou inclusive a desenhar projetos paisagísticos para muitas casas e mansões de Fortaleza. Portanto, o condomínio Jardim da Bárbara nasce tomado de estufas, como um berçário de mudas de plantas, um útero, né?”, poetiza, orgulhosa, a mãe do lugar. 

O dedo verde é herança genética sim. Sandra lembra que foi a mãe que plantou as primeiras árvores frutíferas do terreno que lhe ficou de herança e um já foi o quintal de sua infância e adolescência em Fortaleza, onde tinha vista frontal para céus estrelados em noites ainda silenciosas. Simultaneamente, a semente havia sido lançada na Serra de Maranguape, onde a família mantinha um sítio inesquecível para quem lá esteve correndo livre, leve e solta quando criança, imersa numa descoberta lúdica e intuitiva do mundo sensorial, aquele que se nutre da relação com tudo o que pulsa vivo e cresce em volta, independente da ação humana. 

“Lembro que bem menina eu já adorava me embrenhar nas matas, sozinha. Montava a cavalo e assim passava o dia inteiro entre plantas e bichos, observando tudo com a imaginação a mil. Assim, nunca me sentia só junto à natureza, ou seja, ela sempre me fez companhia e isso foi crescendo em mim. A tal ponto que, adulta, até hoje não consigo permanecer muito tempo em uma área urbana sem que possa fugir vez em quando para uma praia, serra ou sertão. Preciso ver o pôr-do-sol, o nascer da lua, o arvoredo. É como eu recarrego as energias. Se perder isso vou murchando, sem exagero. Daí a razão de ser do jardim: é para me manter viva e feliz mesmo, é um modo de existir com vitalidade e alegria, cercada de beleza, claro”, garante, apontando para os beija-flores que se refugiam no lugar e a fazem constatar, de novo, que ali nunca estará só.

Começou com uns vasinhos ornamentais e algumas poucas suculentas. Logo depois, sem cálculo ou razão aparente, passou a querer mais e mais. Talvez porque, em plena pandemia, a médica Silvia Melo havia optado por se aposentar e levar uma vida mais simples, o que para ela significava mudar-se para um apartamento menor e fazer daquele pequeno espaço um lugar de aconchego. Em janeiro último, ela também deixaria a coordenação do curso de Medicina da Universidade de Fortaleza para assumir a Assessoria Pedagógica, o que lhe daria mais tempo para o doutorado. E assim, menos atribulada, é que se rendeu a um prazer interrompido: aquele que via a mãe sentir junto às plantas.  

“Minha filha que mora na Austrália começou a cultivar uma horta em casa e quando fui visitá-la saí de lá com aquele desejo de ter também. E hoje tenho hortelã, cidreira, menta, alecrim, orégano, manjericão, tomate cereja e até pimentão, meu orgulho maior, plantados por mim. O grande barato foi pegar a semente do pimentão, colocar de molho, plantar, transplantar e vê-lo enfim brotar”, descreve a médica que também encontrou uma fonte de relaxamento no minúsculo espaço da varanda agora tomada de plantas. “É tudo muito novo e surpreendente pra mim. Mas cheguei a um ponto em que agora estou mandando fazer um móvel para colocar mais plantas, além das que ocupam a casa quase toda. Ou seja, se antes eu comprava plantas para a casa atualmente estou construindo uma casa para as plantas”, diverte-se. 

Para Silvia, cultivar é feito cuidar. E talvez a razão de ser do ofício de uma vida toda sirva para justificar a “febre” do novo hobbie. “Venho desenvolvendo inclusive uma outra relação com o alimento quando colho na varanda a folha de manjericão que plantei para fazer meu molho pesto. Outro dia, vendo que ficaria apertado plantar alface na minha horta, resolvi descer e encontrar um espaço para ele na área comum do condomínio. Tempos depois, minha ajudante sobe com uma folha de alface na mão, deliciosa. E agora sonho com uma horta comunitária. Não tenho dúvida de que esse movimento é curativo e contagioso, além de divertido. Ao invés de estar à frente da TV absorvendo a dor dos noticiários hoje vejo vídeos no Youtube sobre como plantar. E já inoculei esse vírus verde nas minhas irmãs, que passaram a ir ao Eusébio comigo aos sábados comprar mudas de plantas. Tudo isso diz sobre a energia in natura com a qual devemos ter contato pata também espalhar”, observa.

Cresceu subindo em árvore, comendo fruta do pé, criando cães e passarinhos soltos. Integrante do Laboratório de Estudos das Relações Humano-Ambientais (LERHA) do Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade de Fortaleza, a psicóloga Márcia Frezza mobiliza as próprias memórias da infância para dar corpo a pesquisas científicas que giram em torno das diversas formas de relação possíveis entre a pessoa e o ambiente. Segundo ela, a construção da própria identidade do sujeito não se dá no âmbito circunscrito de seu mundo interno, mas a partir de uma relação intrínseca e inseparável com o seu entorno. Daí porque a contemplação da natureza e o cultivo das plantas devem também ser investigados do ponto de vista da promoção da saúde física e psíquica. 

O simples ato de contemplar uma paisagem é capaz de gerar em nós uma sensação de prazer e tranquilidade, assim como é possível despertar o cognitivo e a percepção de uma criança a partir do cultivo e acompanhamento do crescimento das plantas. O ato de cultivar, portanto, é terapêutico sim, porque age sobre as emoções humanas, além de estreitar a relação do homem com a natureza, abrindo caminho para uma nova ética: a do cuidado de si e do outro. Entretanto, a pandemia está aí para demonstrar o quão problemática e adoecedora tem sido a ação humana sobre o ambiente onde a pessoa se desenvolve de forma integral. Já não há mais dúvida de que a crise de saúde global é decorrente da destruição do meio ambiente”, provoca Márcia. 

Feito o diagnóstico, é preciso vislumbrar soluções. E uma delas diz respeito à urgência em multiplicar os ambientes restauradores promotores da saúde mental. Eis a exortação feita pela coordenadora do LERHA e também psicóloga, Karla Patrícia Ferreira. “O próprio campus da Unifor é um exemplo de ambiente restaurador pela combinação de verde, água, iluminação e ventilação naturais. Não é à toa que sempre peço para os alunos caminharem devagar de um bloco para o outro, ativando um estado contemplativo. Também opto costumeiramente por dar aula ao ar livre, sentada sob as árvores. É uma forma de conexão pessoa-natureza, já que o ambiente influencia na percepção, no bem-estar e na própria aprendizagem”, sustenta.

Foco também nos ambientes construídos: cidades, hospitais, escolas, creches, presídios e até os próprios domicílios são lócus de investigação da Psicologia Ambiental quando a ordem é detectar o nível de interferência de determinados espaços sobre o comportamento humano. Assim, cada microcosmo pode servir de medida para a aferição da qualidade de vida de determinado grupo social. Karla Patrícia ilustra: foi no ambiente familiar que o LERHA centrou foco quando integrou uma pesquisa interdisciplinar realizada em todo o Brasil a fim de detectar o nível de estresse gerado durante a pandemia junto a quem conviveu entre quatro paredes.

“O distanciamento social e a reclusão causaram estresse ambiental por conta da perda de privacidade em casa. E foi preciso descobrir ou construir no próprio espaço doméstico os ambientes restauradores, ou seja, aquela varanda agora usada para cultivar o verde, encher de flores, acessar a luz solar, dar uma respirada, fazer uma pausa. Perdemos o casulo inviolável, que virou local de trabalho, lazer, estudo e refeição ao mesmo tempo, e assim tivemos que recorrer ao efeito terapêutico da natureza sobre nós. Não é à toa que mais do que nunca espalhamos vasinhos pela casa e combatemos a solidão com a jardinagem, que é a mais pura fonte de bem-estar. E eu me incluo nesse rol de pessoas que já cultivavam plantas mas intensificaram o hábito em nome de um acertado autocuidado”, afirma Karla Patrícia.
 

O tema da dissertação de mestrado estava à frente de seus olhos o tempo todo. Mas o psicólogo e mestrando do Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade de Fortaleza, Rafael Barbosa, só enxergou o óbvio quando a Covid-19 e sua conseqüente crise sanitária interromperam um trabalho de campo presencial que ele se propunha a realizar na comunidade do Titanzinho, em Fortaleza. Obrigatório, o isolamento social fez o já amante de orquídeas olhar para dentro: de si e de seu  habitat. E veio o clique: passaria a pesquisar o que já vinha experimentando na pele, ou seja, a jardinagem como estratégia de enfrentamento dos efeitos psicológicos adversos da pandemia.

“Do limão fiz uma limonada, porque cultivo orquídeas no meu próprio apartamento desde 2015, quando comprei a primeira da coleção, na Praça das Flores. Ao passo que passei a cultivar, também busquei estudar sobre o tema e o que mais me encantou nelas, além da beleza rara, claro, foi o desafio que impunham para serem cultivadas da maneira correta. As orquídeas são reconhecidamente difíceis e a espécie que eu cultivo cresce nas árvores, o que torna ainda mais desafiador o cultivo em ambiente doméstico, com estufas improvisadas e usando vasos de plástico com brita de madeira ou casca de pinho ao fundo. É todo um ritual de cuidado que, posso garantir, previne e combate qualquer quadro depressivo ou de estresse agravado nesses dias de tensão e dor causados pela pandemia”, defende o orquidófilo que credita o sucesso de seu jardim de orquídeas ao grau de luminosidade e à qualidade da água usada.

Delicadeza a olhos vistos. Rafael, que mora sozinho no térreo de um prédio baixo, na Aldeota, pediu ao proprietário a licença poética de montar seu orquidário no terraço em anexo. Autorizado a seguir em frente, hoje não sabe sequer descrever o prazer embutido no simples ato de abrir a janela todas as manhãs e dar de cara com cerca de 60 orquídeas, suas “companheiras de vida”. “É uma fonte de relaxamento e, pra mim, uma experiência quase transcendental mesmo manter esse corpo a corpo com a natureza. Fui criado no interior do Mato Grosso, vendo arara cruzando o céu no pôr-do-sol. Meu pai estudou agronomia e as árvores sempre estiveram no centro das nossas atenções.Quando me torno psicólogo e encontro na Unifor uma linha de pesquisa afinada com aquilo que me constitui, como é a Psicologia Ambiental, nada mais conseqüente e profícuo do que contribuir com os estudos e a literatura científica que prova a ligação direta entre saúde mental e os chamados ambientes restauradores, que previnem e nos recuperam de desgastes emocionais”, observa o mestrando também ligado ao Laboratório de Estudos das Relações Humano-Ambientais (LERHA) do Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade de Fortaleza.