null Drauzio Varella participa do lançamento da Doe de Coração e profere palestra sobre carreira profissional

Ter, 14 Agosto 2018 14:43

Drauzio Varella participa do lançamento da Doe de Coração e profere palestra sobre carreira profissional

O evento acontece no dia dia 5 de setembro, a partir de 17h30, na Praça Central do Campus da Universidade de Fortaleza


Médico oncologista, cientista e escritor, Drauzio Varella é reconhecido por popularizar a informação médica no Brasil (Foto: Gislayne Miyono)
Médico oncologista, cientista e escritor, Drauzio Varella é reconhecido por popularizar a informação médica no Brasil (Foto: Gislayne Miyono)

Por uma dessas motivações insondáveis da infância, Drauzio Varella queria ser médico antes de se entender por gente. E perseverou para além do consultório e do plantão. Hoje, o “doutor Drauzio” é um dos principais nomes na popularização de informações médicas do Brasil, com atuação destacada no rádio, na TV e na internet.

Cem anos depois de Anton Tchekhov, colega de letras e estetoscópio, registrar suas impressões sobre os presídios da ilha de Sacalina, Drauzio Varella imergiu no universo prisional do Carandiru e da Penitenciária Feminina da Capital, em São Paulo, trazendo relatos pungentes de apenados e carcereiros.

Drauzio Varella estará na Universidade de Fortaleza dia 5 de setembro para participar do lançamento da 16ª edição do Movimento Doe de Coração, iniciativa da Fundação Edson Queiroz de incentivo à doação de órgãos e tecidos, e para proferir palestra sobre “Trajetória e Carreira Profissional”, voltada para alunos de ensino médio do Ceará. Gratuitos, ambos os eventos acontecerão na Praça Central do Campus da Unifor, a partir das 17h30.

Na entrevista exclusiva a seguir, ele fala sobre as mudanças no ensino e exercício da Medicina, a importância de cultivar interesses humanísticos e a dedicação como chave para uma carreira plena.

UNIFOR: Gostaríamos de saber que caminhos levaram o senhor a escolher a Medicina como profissão. O senhor teve dúvidas entre a Medicina e outras carreiras? Durante sua graduação, teve algum questionamento ou vontade de desistir? Se sim, o que o levou a continuar?

DRAUZIO VARELLA: Eu não passei por nenhum desses dilemas. Diz o meu pai que quando me perguntavam o que eu ia ser quando crescer, eu já dizia que seria médico. Eu nunca tive dúvida de que eu queria ser médico. Nem antes, nem durante nem depois de ter exercido a profissão por tantos anos. Há alguns que têm dúvida e entre várias profissões escolhem Medicina. Isso não quer dizer que isso seja melhor ou pior. Mas tem outros que desde pequeno tem certeza do que quer, e este foi o meu caso.

UNIFOR: Que diferenças o senhor observa entre o curso de Medicina que o senhor fez nos anos 1960 na USP e a formação médica atual? Como a passagem do tempo não necessariamente implica uma trajetória ascendente e evolutiva, quais as principais perdas e ganhos que a área sofreu, a seu ver?

DRAUZIO VARELLA: Esta pergunta tem uma resposta muito longa. E a formação médica era muito diferente naquela época porque a Medicina era muito diferente. Nós tínhamos poucos recursos laboratoriais e pouquíssimos recursos de imagem. Era praticamente só o raio-X. Não havia tomografia, não havia ressonância magnética, a Medicina era muito mais clínica e muito mais imprecisa também. Eu me lembro do tempo das laparotomias exploradoras, cirurgias que eram feitas quando havia um quadro abdominal que não ficava caracterizado e era preciso abrir os doentes, fazer uma laparotomia para esclarecer o quadro. Muitas dessas laparotomias eram chamadas de brancas porque não mostravam nada. Hoje, com as imagens, a gente tem muito mais precisão. Eu acho que os bons alunos de hoje são melhores que os do meu tempo. Você tem meninas e meninos com uma formação muito boa hoje em diversas faculdades espalhadas pelo País. Na minha época havia poucas faculdades, então era muito mais fácil ter bons professores, uma organização melhor dos cursos médicos. A proliferação das faculdades em Medicina criou um problema sério porque nós não temos professores preparados para tantas escolas médicas. Vale lembrar que o Brasil tem muito mais cursos de Medicina do que os Estados Unidos, que tem mais de 300 milhões de habitantes, e do que a China, com 1,2 bilhão de habitantes. Controlar a qualidade desses cursos médicos é dificílimo.

UNIFOR: Aos 75 anos, o senhor tem uma carreira bastante ativa, atuando em diversas searas (pesquisa, aulas, esporte, palestras, literatura, entre outras). Qual é o segredo para se manter uma carreira expressiva como a sua num País que valoriza tanto a mão de obra jovem?

DRAUZIO VARELLA: De fato, o Brasil não está preparado para este fenômeno moderno que é o envelhecimento da população. A faixa etária que mais cresce hoje é aquela que está acima dos 60 anos. Nós continuamos a valorizar a mão de obra mais jovem num país onde esta mão de obra vai ficar cada vez mais escassa. No meu caso particular, eu sempre tive a segurança de que eu fazendo só Medicina, só vendo doente o tempo todo, eu não seria feliz. Porque eu tinha outros interesses: eu queria escrever, participar de cursos, ter tempo para estudar, acompanhar os congressos internacionais, praticar esportes. E foi o que eu fiz, eu consegui um certo equilíbrio motivado pela curiosidade. Acho que quanto mais abrangente for o conhecimento do médico, quanto maior o interesse por outras áreas culturais, ele vai fazer uma Medicina melhor e será mais respeitado por todos. Porque um médico que não lê nada fora da Medicina, que não tem interesse pela organização da sociedade é um médico que tem uma visão muito limitada pra entender quem são os pacientes que atende. Acho que no meu caso, nessa idade, continuo sendo solicitado, trabalhando 14, 15 horas  por dia justamente porque eu tive este interesse diversificado. E porque continuei e continuo estudando. A Medicina, em particular, eu vou pelo menos a três congressos internacionais todos os anos. E tento acompanhar a área em que eu atuo, a Oncologia, muito de perto. Mas sem perder de vista o todo. Leio revistas de Clínica, leio o The New England Journal of Medicine, o Journal of the American Medical Association pra ter uma formação geral na Medicina, sem me limitar à Oncologia.

UNIFOR: Que conselho o senhor daria a um estudante que decidiu ingressar no curso de Medicina? Ou que se sente pressionado pela família a fazer este curso, mas não tem certeza de que esta é a profissão que deseja seguir?

DRAUZIO VARELLA: Primeira coisa: você não deve sucumbir às pressões familiares. Tem que procurar dentro de você o que você quer, o que você gosta de fazer. Medicina é uma profissão pra quem gosta de estudar. Se você não gosta muito de estudar, não tem muita paciência de se aprofundar em determinados assuntos, não faça Medicina. Vai fazer outra coisa. A dedicação que a Medicina exige de todos nós, plantões, passar a vida inteira estudando – a gente nunca para de estudar. Se você usar toda essa dedicação, todo esse tempo que você vai gastar no preparo e no exercício da Medicina em outra profissão, você vai se dar bem. O problema é que muitos ficam inseguros: “Será que eu gosto de Medicina? Ou eu gosto de outra coisa?”. E aí não tem jeito, porque o certo seria tomar esta decisão um pouco mais tarde. Mas no Brasil você tem que escolher a profissão que vai exercer para o resto da vida aos 17 anos. É muito cedo. Eu sou uma pessoa muito diferente do que eu era aos 17 anos, e por sorte continuo a gostar da Medicina, poderia não gostar mais. Sempre tem uma margem de erro. Mas só devem fazer Medicina aqueles que gostam de estudar bastante.