null Corrente de afetos e aprendizados: professores da Universidade de Fortaleza compartilham cartas entre si

Qui, 30 Julho 2020 17:16

Corrente de afetos e aprendizados: professores da Universidade de Fortaleza compartilham cartas entre si

Saiba mais sobre o projeto “O Que Aprendi: Cartas de Professor”, em que docentes da instituição escrevem a respeito de suas descobertas na quarentena.


Projeto idealizado por Pedro Boaventura, docente da Unifor, busca atingir pessoas e conectar ideias por meio de cartas (Imagem: Divulgação)
Projeto idealizado por Pedro Boaventura, docente da Unifor, busca atingir pessoas e conectar ideias por meio de cartas (Imagem: Divulgação)

O poder da palavra escrita em aproximar pessoas é imensurável e data de muito antes das mensagens instantâneas. Durante as grandes guerras da humanidade, por exemplo, as cartas eram o único instrumento disponível para manter conexão entre os distantes, e por isso assumia valor praticamente de jóia. Aos amantes e bons amigos, o charme romântico de uma mensagem escrita à punho era tudo o que bastava para alimentar afetos. Até hoje, complexas narrativas são contadas por meio do gênero epistolar, que sobrevive ao tempo. Não importa como estejam formatadas; letras eletrônicas não substituem a pessoalidade da tinta no papel.

Assim como os tempos remotos que forçaram distâncias, a pandemia do novo coronavírus ampliou as distâncias físico-espaciais entre os indivíduos, ainda que estas tenham se estreitado virtualmente. Na tentativa de reaproximar pessoas que se querem bem, disponibilizando um canal especial para compartilhamento de experiências e reflexões, a Universidade de Fortaleza, da Fundação Edson Queiroz, acaba de dar início ao projeto “O Que Aprendi: Cartas de Professor”.

Diferente do que se espera do rápido tête-à-tête cotidiano em aplicativos de chat, a iniciativa propõe um momento de dedicação e sensibilidade, no qual os docentes da instituição possam discorrer entre si a respeito dos aprendizados e percepções que bateram à porta durante a quarentena. Na dinâmica, quinze educadores, de diferentes áreas, convidam-se sucessivamente para trocar missivas manuscritas, relatando suas novas percepções; estabelecendo, assim, uma corrente imprevisível de significados.

O isolamento mexeu muito com as pessoas, tanto na dimensão física quanto na emocional. Colocou todo mundo em situações-limite para as quais não se estava preparado. Houve solidão, medo, raiva e todo tipo de perda durante essa forçada experiência. Essa foi a primeira “herança” desse período. Mas foi só isso? A tragédia com suas negativas e garantidas sequelas será tudo que restará? E a ‘parte boa’?”, comenta o professor Pedro Boaventura, idealizador do projeto, sobre as circunstâncias que o motivaram a apresentar sua ideia à Universidade. “Como é que podemos transformar uma situação dessa em algo positivo e tirar uma lição? Como podemos fazer deste limão uma limonada?”, continua.

A resposta para a inquietação de Pedro veio com a necessidade de reflexão sobre o momento, de forma a se construir um legado construtivo e restaurador; de reunir informações, conselhos e filosofias que pudessem ajudar outras pessoas, atingindo-as de forma positiva. “É por isso que se escolheu o formato carta, pelo poder evocativo da palavra escrita à mão, algo que se perdeu com a tecnologia, e o ambiente da amizade, essa dimensão da existência que nos fez tanta falta no isolamento”, explica Boaventura.

Esperanças em tinta e papel

O projeto “O Que Aprendi: Cartas de Professor” demonstra uma preocupação ainda mais profunda da Universidade de Fortaleza em relação à atual situação do mundo. A instituição promoveu anteriormente ações diretas de combate, como campanhas informativas, de pesquisa e de vacinação. Agora, essa atenção se estende para outro nível: a criação de conhecimentos por meio do debate filosófico, potencializando esperanças para a construção de dias melhores.

O fluxo do projeto se dá da seguinte maneira: cada professor que for contemplado com a carta de um amigo, se compromete a escrever outra missiva para outro amigo professor, dando continuidade à corrente. O documento deve ser manuscrito e ter a extensão de até duas páginas. Recomenda-se que cada participante escreva sua carta até 48h após receber a que lhe foi endereçada. Após terminada a redação, deve-se contatar a Unifor para o envio de um mensageiro, que levará a correspondência ao destinatário indicado. Neste primeiro momento, quinze nomes serão membros da iniciativa.

Os próximos caminhos da ação se guardam promissores: há expectativas de que as cartas, redesignadas como relíquias de um 2020 conturbado, sejam dispostas em exposição ou website. Assim, suas palavras podem ser compartilhadas e levar reflexões a todos os seus destinatários em potencial.