Sistemas Viários Seguros: uma nova visão para zerar as mortes no trânsito

Quarta-feira, 22 Agosto 2018 15:30
Por Lara Montezuma

Londres lançou no último mês de julho um plano de segurança viária com metas ousadas de redução de mortos e feridos graves no trânsito. A intenção das autoridades locais com é diminuir as mortes em 65% até 2022 e zerar o índice até 2041. Dentre as principais ações para alcançar esses objetivos estão a redução de velocidade máxima para 20 mph (ou 32 km/h) na área central da cidade e outros bairros, totalizando 144 km de vias. Outras ações consistem no uso de inteligência para identificação de problemas e intensificação da fiscalização para dissuadir os condutores de terem comportamento de risco.

O plano está alinhado com o conceito de “Visão Zero” e preconiza que nenhuma morte no trânsito pode ser tolerada pela sociedade. O conceito fundamenta-se ainda na premissa de que nós cometemos erros e que os corpos humanos têm uma capacidade limitada para sobreviver a impactos. Deste modo, o trânsito deve ser planejado para proteger os mais vulneráveis. Esta nova percepção de gestão de trânsito foi apresentada ainda no início da década de 1990 e integra a concepção de Sistemas Viários Seguros. O pontapé inicial dessa corrente global foi dado na Suécia e seguido pela Holanda, países considerados referência em segurança no trânsito no mundo.

Com base nesse entendimento, todo o planejamento do trânsito deve priorizar as pessoas em detrimento dos veículos.  A pesquisa  Zero Deaths and Serious Injuries - Leading a Paradigm to a Safe System (em tradução livre, “Nenhuma morte ou ferimento grave - encaminhando a mudança para um sistema seguro”), lançada em janeiro de 2018 pelo World Resources Intitute (WRI, na sigla em inglês)demonstra como o Visão Zero pode obter êxito.  O trabalho venceu o prêmio Road Safety Awards (Prêmio de Segurança Viária) 2017 e conta com resultados práticos, como a ausência de mortes no trânsito durante 1 ano em 88 cidades da Europa.

O conceito de Sistemas Seguros envolve estratégias integradas que promovem a coordenação de várias instituições ligadas ao planejamento urbano e à gestão da mobilidade. Isso porque a dinâmica das ruas ocorre a partir de uma relação entre variados componentes como infraestrutura física, leis, regulamentações, uso do solo, usuários nas vias, fiscalização, entre outros. Em outras palavras, significa compartilhar a responsabilidade com todos que fazem o trânsito ser possível, com a premissa de que os governos precisam adotar medidas para proteger as pessoas no trânsito.

Os veículos com o seu design e itens de segurança, como os airbags por exemplo, também devem ajudar a salvar vidas e reduzir lesões. Os gestores do sistema de vias de cada região devem também avaliar os limites de velocidade, para verificar se estes são adequados para a circulação de veículos, ciclistas e pedestres. O propósito é garantir que as pessoas consigam reduzir as possibilidades de acidentes e, caso se envolvam em um, sejam capazes de sobreviver sem maiores sequelas e traumas.

Prefeitura de Fortaleza elabora plano de Segurança Viária com apoio da Iniciativa Bloomberg

Para modificar o número de mortes causadas pelo trânsito no Brasil - que chegam até a 1,25 milhões de pessoas mortas por ano -, a Iniciativa Bloomberg de Segurança Viária Global apoia a implementação de medidas em Fortaleza e São Paulo, as primeiras metrópoles a adotar abordagens de sistema viário seguro no país. As duas cidades desenvolvem um plano de ações que será formado por medidas que envolvem o planejamento do desenho de ruas seguras, a melhoria das opções de mobilidade, a regulamentação de velocidade nas vias, entre outros.

A iniciativa foi apresentada em Março deste ano à autoridades de trânsito da Capital no II Fórum do Observatório de Segurança Viária, com apoio da Prefeitura e da Universidade de Fortaleza (UNIFOR). O evento teve a participação das pesquisadoras Claudia Adriazola, gerente global de segurança viária do WRI, e Anne Ericksson, pesquisadora da Dinamarca. Elas frisaram a necessidade de dividir as responsabilidades no trânsito.

Segundo o secretário executivo de Conservação e Serviços Públicos, Luiz Alberto Saboia, Fortaleza está preparada para elaborar um plano de segurança viária, que deve começar a ser posto em prática no próximo ano. Para que isso seja possível, o Município vem levantando dados nos últimos anos sobre acidentes, mortes no trânsito e perfil de vítimas, além de promover o diálogo entre de diversas secretarias da Prefeitura e diversas entidades civis, através do Comitê Municipal de Segurança Viária.

“O plano permite dar um passo além no sentido de assumir metas objetivas de redução e manutenção da redução no número de acidentes e assumir premissas de como a cidade, sociedade e poder público veem o problema. O plano é um passo muito forte no sentido de preparar essa e as próximas gerações para entender que nenhuma morte no trânsito não é aceitável, não é uma fatalidade, é algo que pode ser evitado com um conjunto de ações”, afirma o secretário.

De acordo com as especialistas, os princípios dos sistemas seguros devem ser a base das nossas políticas. Fortaleza está obtendo bons resultados mesmo antes da implementação de um sistema viário mais seguro. O ano de 2017 registrou a terceira queda consecutiva no número de vítimas fatais no trânsito. Houve uma redução de 9% de ocorrências em relação a 2016, com um total de 256 mortes. Desde o início da Década de Ação para a Segurança Viária da Organização das Nações Unidas (ONU) em 2011, a taxa de mortalidade no trânsito por 100 mil habitantes, caiu 35%, e chegou a 9,7 mortes por 100 mil habitantes em 2017.

“A grande vantagem do plano é deixar claro, no papel, as metas, responsabilidades e objetivos em relação ao que buscamos para a segurança no trânsito em Fortaleza. Ao final, esse documento terá condições que garantir a sustentabilidade das ações pelos próximos anos e décadas, para que um dia consigamos alcançar zero mortes nas ruas e avenidas da nossa cidade.” avalia Dante Rosado, coordenador executivo da Iniciativa Bloomberg de Segurança Viária Global.