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Seg, 10 Janeiro 2022 10:05

Entrevista Nota 10: Raissa Freitas e a importância da saúde mental na infância

Psicóloga e doutora em Saúde Coletiva destaca como a Biblioterapia auxilia na qualidade de vida das crianças


Raíssa Freitas Gomes é egressa do Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva da Universidade de Fortaleza (Foto: Acervo pessoal)
Raíssa Freitas Gomes é egressa do Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva da Universidade de Fortaleza (Foto: Acervo pessoal)

Ter seu fortalecimento emocional garantido para crescer com qualidade de vida é um dos aspectos essenciais para o desenvolvimento das crianças. Os psicólogos, portanto, desempenham papel fundamental na sociedade enquanto profissionais que atuam na prevenção e promoção da saúde mental.  

Para Raissa Freitas Gomes, psicóloga e doutora em Saúde Coletiva pela Universidade de Fortaleza, a Biblioterapia é uma ferramenta ativa e eficaz ao cuidar do outro. Isso porque o valor terapêutico da leitura é potência por meio da qual crianças, jovens e adultos podem compartilhar histórias e conhecimento de forma saudável.  

Com exclusividade ao Entrevista Nota 10, a psicóloga destaca a importância do papel da família na saúde mental das crianças durante a pandemia de Covid-19. Confira:

Entrevista Nota 10 - Raissa, como surgiu o interesse em estudar a saúde mental infantil na sua tese de doutorado? 

Raissa Freitas - A minha missão profissional, enquanto psicóloga, sempre foi atuar em prol da prevenção e promoção de saúde mental. Ao longo da minha trajetória, venho trabalhando com famílias e pessoas nos seus mais diversos ciclos geracionais (da primeira infância à terceira idade). No entanto, quando tratamos de prevenção e promoção de saúde mental, vale a máxima "quanto mais cedo, melhor". A psicologia, psicanálise e neurociência já comprovam isso. Portanto, foi a partir dessa convicção que elegi não só a saúde mental infantil, como também a saúde mental materna perinatal, como focos de atuação e estudo.

Entrevista Nota 10 - O estudo foi feito com mães em situação de vulnerabilidade social para a coleta de dados. Quais foram os desafios dessa experiência, tendo em vista o cenário de pandemia? 

Raissa Freitas - Com certeza, o principal desafio que enfrentei ao longo desses anos no doutorado foi coletar dados na pandemia. A minha pesquisa foi um estudo aplicado, a partir de uma intervenção com grupos, e o contexto pandêmico impôs a necessidade de isolamento e distanciamento social. Isso atrasou a coleta porque precisei esperar que as medidas de isolamento fossem flexibilizadas e também limitou o tamanho da amostra. 

Entrevista Nota 10 - E de que forma a Biblioterapia pode ser uma grande aliada no momento em que atravessamos tantas dificuldades?

Raissa Freitas - Muito além de uma terapia por meio dos livros, como o nome nos leva a crer, a Biblioterapia é o cuidado com o outro por meio das histórias. E quem não precisou de cuidados em algum momento nessa pandemia? Todos nós sofremos com o isolamento, mudança de rotina, medo, perdas, ansiedades, angústias, estresse entre outros males. Além de muito potente, a Biblioterapia é uma técnica de baixo custo, aplicável a pessoas de qualquer idade, independente do grau de escolaridade. 

Entrevista Nota 10 - Como mães e pais podem estar atentos ao desenvolvimento dos filhos? Sabemos que conciliar o tempo e desfrutar da qualidade de vida, na sociedade em que estamos inseridos, é uma questão principalmente por conta da alta demanda produtiva…

Raissa Freitas - Na nossa sociedade, os principais cuidadores dos filhos são os pais, especialmente as mães. Esses vínculos afetivos iniciais que a criança estabelece, lá na primeira infância e desde a gestação, com os seus principais cuidadores são a base da nossa saúde mental. Sendo as figuras parentais, portanto, tão importantes para o desenvolvimento infantil,  pais e mães não só podem como devem estar sempre atentos às suas crianças. E essa atenção exige disponibilidade e presença de qualidade. Por mais que, hoje, a criação dos filhos concorra com mil e uma outras demandas vividas pelos pais, a responsabilidade inicial pelo desenvolvimento infantil, com ênfase aqui no desenvolvimento emocional, é parental. Não tem como terceirizar isso. 

Entrevista Nota 10 - Outro desafio é gerenciar o grande fluxo de informações presente nas telas de celular, aparelhos aos quais, cada vez mais cedo, as crianças têm acesso. Como tecnologia e saúde mental se relacionam, neste sentido?

Raissa Freitas - A tecnologia por si só não é uma vilã para a saúde mental. O problema existe quando há um uso precoce, excessivo e/ou inadequado das crianças com as telas. Em síntese, é entender que, quanto mais tempo as crianças passam conectadas às telas (celular, tablet, televisão, videogame...,) menos tempo elas vão ter, por exemplo, de interação, o que pode acarretar, dentre outros, prejuízos sociais e emocionais. Criança precisa de conexão? Precisa! De conexão com o outro e com as oportunidades de desenvolvimento que o mundo real nos traz. 

Gostaria de chamar atenção também para os prejuízos que outro fenômeno envolvendo a tecnologia tem trazido às crianças: a parentalidade distraída. Não são só as crianças que estão hiperconectadas com as telas, os pais também. A parentalidade distraída diz respeito exatamente ao tempo de conexão dos pais com as telas, quando deveriam estar interagindo com os seus filhos, o que traz repercussões emocionais muito negativas para as crianças. Estamos vivendo um tempo de (des) conexão!

Entrevista Nota 10 - Raissa, para finalizar: qual é a importância do profissional de Psicologia nesse contexto? Sabemos que, felizmente, estigmas e tabus relacionados à busca por ajuda profissional vem caindo ao longo dos anos…

Raissa Freitas - Infelizmente, a saúde mental ainda é relegada a segundo plano. Quem dera se as pessoas cuidassem da saúde mental como cuidam da saúde física! Corpo e mente são indissociáveis. Muita gente, no entanto, tem vergonha de buscar ajuda psicológica e desconhece o fato de que o psicólogo não atua só no tratamento, mas também na prevenção e na promoção da saúde mental.

Quando tratamos da infância é importante, ainda, ter a clareza de que todos nós (pais e profissionais) que convivemos com crianças podemos e devemos ser agentes de promoção de saúde mental infantil.Tenho perfis no instagram voltados para pais e profissionais interessados em cuidar da saúde emocional das crianças por meio das histórias (@enquantoconto_cuido) e para interessados em conteúdo sobre saúde mental maternoinfantil (@raissafreitas.psi)