seg, 20 abril 2020 09:48
Entrevista Nota 10: reforço na luta contra a Covid-19
A professora Cristina Moreira destaca como será a atuação da Unidade de Diagnóstico Covid-19 – Unifor, certificada no dia 17 de abril pelo Lacen-CE para analisar amostras dos exames.
Testar, testar, testar. A recomendação enfatizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como principal arma de combate à pandemia causada pelo novo coronavírus foi a estratégia utilizada por países como Alemanha e Coreia do Sul, hoje referências por estarem conseguido controlar a Covid-19. O Ceará, apesar de ser um dos estados brasileiros que mais realiza exames laboratoriais, ainda está longe do número ideal de testagens.
Para ampliar a capacidade de diagnóstico da Covid-19 no estado, a Universidade de Fortaleza (Unifor) adaptou o Laboratório de Bioagentes Patogênicos do Núcleo de Biologia Experimental (NUBEX), localizado no prédio do Núcleo de Assistência Médica Integrada (NAMI), em um novo centro de diagnóstico molecular da doença. No espaço, denominado de Unidade de Diagnóstico Covid-19 – Unifor, serão analisadas as amostras vindas do Laboratório Central de Saúde Pública do Ceará (Lacen-CE). Inicialmente, a Unidade terá capacidade para três mil análises por mês, com expectativa de ampliação para até seis mil análises mensais.
O novo espaço recebeu a certificação para a realização do diagnóstico da Covid-19 pelo Lacen na última sexta-feira (17) e aguarda o recebimento dos insumos laboratoriais para entrar em funcionamento. “A expectativa é que até o final dessa semana já estejamos funcionando”, informou a professora do Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas, Doutorado em Biotecnologia (Renorbio) e curso de Farmácia da Unifor, Cristina Moreira, atual diretora do Nubex.
Para a implantação da Unidade de Diagnóstico Covid-19, a Unifor contou com uma equipe executora composta pelos professores do Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas (PPGCM) Adriana Rolim, Cristina Moreira, Danielle Malta (coordenadora do laboratório de Bioagentes Patogênicos) e Kaio Tavares e do professor Ângelo Roncalli do curso de Farmácia, sob a coordenação do professor Vasco Furtado, diretor da Diretoria de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (DPDI).
Em conversa com o Entrevista Nota 10, a professora Cristina Moreira explicou como vai funcionar a Unidade de Diagnóstico Covid-19 e a importância da ação para ajudar as autoridades de saúde no combate à Covid-19. Confira.
A Unifor, através do Núcleo de Biologia Experimental (Nubex), vai realizar o diagnóstico de Covid-19. Como vai funcionar o projeto e qual será a capacidade de diagnósticos mensais?
O laboratório habilitado para o diagnóstico molecular da Covid-19 firmou parceria com a Secretaria de Saúde do Estado do Ceará (SESA), através do Laboratório Central de Saúde Pública do Ceará (Lacen/CE), e conta também com o apoio da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap). O fluxo, inicialmente estabelecido, consiste em analisar as amostras encaminhadas pelo Lacen. Após o cadastramento das amostras recebidas, as mesmas serão devidamente preparadas, terão o material genético, RNA, extraído; após a realização dessas etapas, ocorrerá a detecção molecular do vírus SARS CoV-2 (novo coronavírus), caso esteja presente na amostra, utilizando a técnica de RT-PCR em tempo real, em seguida os resultados obtidos serão analisados e o laudo emitido será encaminhado ao Lacen. A capacidade inicial é de 3 mil análises por mês. O laboratório funcionará em regime intenso de trabalho, com três turnos diários, trabalhando 24 horas por dia e 7 dias por semana.
A mão de obra para a realização dos exames nos parece ser muito específica. Quem são os profissionais que trabalharão no projeto? Houve algum tipo de treinamento específico para esse trabalho?
De fato, para atuar no laboratório de diagnóstico molecular da Covid-19 precisaremos de mão de obra bastante qualificada, os técnicos selecionados que ficarão responsáveis pela etapa de RT-PCR em tempo real já têm experiência prévia com a referida técnica, pois trata-se de uma técnica complexa e não teríamos tempo hábil para a realização de um treinamento, já que o laboratório precisa iniciar o seu funcionamento o mais rápido possível. Os professores Kaio Tavares e Danielle Malta foram os responsáveis pela seleção dessa equipe bastante especializada e formada por mestres e doutores em Biotecnologia, Bioquímica, Ciências Médicas, dentre outras áreas. No processo seletivo do corpo técnico, contamos também com a colaboração da psicóloga Rafaela Henrique do RH [recursos humanos] da Unifor. O treinamento de toda a equipe será realizado no início dessa semana e visa enfatizar as normas de biossegurança para assegurar a proteção individual e coletiva da equipe e da comunidade, além de disponibilizar o fluxograma de trabalho que deverá ser criteriosamente seguido para que o diagnóstico ocorra de forma segura e com a acurácia exigida.
Qual a importância do aumento de realização de diagnósticos de Covid-19 neste cenário de pandemia?
A testagem é uma recomendação da Organização Mundial da Saúde e é um dos objetivos estratégicos do Sistema Único de Saúde (SUS) para fazer a contenção adequada da transmissão da doença. A testagem em larga escala combinada ao isolamento social é a melhor estratégia para proteger a população dessa pandemia. Como a Covid-19 é facilmente transmitida, a identificação precoce das pessoas infectadas com o SARS CoV-2 (novo coronavírus) é realizada pelo diagnóstico molecular. Esse é o método mais eficiente e está sendo usado em países que estão conseguindo um melhor controle da expansão da doença, como são os casos observados na Coreia do Sul e Nova Zelândia. Com a implantação dos testes na Unifor, a instituição contribuirá para o aumento da capacidade de diagnóstico da Covid-19 e, consequentemente, colaborará no controle da transmissão do SARS-CoV-2. O diagnóstico precoce permite o isolamento de casos e a quarentena de comunicantes domiciliares, quando associado às medidas de distanciamento social da população, evita a saturação do sistema de saúde e, consequentemente, reduz a mortalidade pela doença.
Por conta da pouca capacidade de diagnóstico instalada no Ceará, os resultados estão demorando cerca de sete a oito dias para serem liberados. No entanto, neste projeto da Unifor, a ideia expectativa é que o resultado seja emitido em um prazo de 24 a 48 horas. Como será viabilizado esse prazo?
Esse é o tempo necessário para a realização das etapas do diagnóstico no laboratório da Unifor, ou seja, as etapas de recepção das amostras enviadas pelo Lacen, preparação das amostras, extração do material genético, RT-PCR em tempo real e análise dos resultados que serão encaminhados ao Lacen. Desta forma, o paciente não obrigatoriamente terá o resultado nesse período de tempo, pois antes da realização do diagnóstico pelo nosso laboratório, ocorrerá a coleta da amostra nas unidades de saúde, encaminhamento das amostras ao Lacen e, posteriormente ao envio dos resultados do diagnostico realizado na Unifor, encaminhamento do laudo do exame pelo Lacen às unidades de saúde.
Um dos problemas relatados para ampliar as testagens no Brasil é o acesso aos insumos necessários, como os reagentes químicos, que estão escassos pela alta demanda mundial. Como vocês resolveram essa questão? Há reagentes garantidos para quantos testes até agora?
Realmente, a aquisição de insumos necessários para a realização do diagnóstico é um problema enfrentado por vários países, principalmente por aqueles que seguiram um caminho bastante equivocado, o de não investir de forma concreta em ciência, tecnologia e inovação, como é o caso do nosso país. Assim, dependemos quase que totalmente da importação desses insumos. Para contornar esse problema, os setores ligados à vice-reitoria de Administração da Unifor estão, desde o início do projeto de implantação desse laboratório, bastante empenhados e, enquanto o laboratório estava sendo adaptado para receber a certificação do Lacen, a aquisição de todos os reagentes, kits, materiais de laboratório foi feita. Estamos aguardando a entrega dos insumos comprados pela Universidade, a previsão de entrega, para maioria deles, é para essa semana. Uma outra estratégia, para iniciarmos o diagnóstico com a maior brevidade possível, é solicitar à SESA o empréstimo de alguns insumos cuja entrega está prevista para o início de maio.
Para a Universidade de Fortaleza e para os cientistas que nela atuam, qual o impacto que um projeto desse porte causa? Mais pesquisas científicas podem surgir a partir dessa ação?
Compete à Universidade, como o cerne da produção do conhecimento, formar recursos humanos qualificados, fomentar inovações tecnológicas disruptivas e, mais do que nunca, atuar na resolução e antecipação dos problemas que afligem a sociedade. Nesse contexto, a Universidade de Fortaleza tem protagonizado várias ações que visam minimizar os danos causados pela Covid-19. Muitas dessas ações gerarão pesquisas científicas, pois envolvem docentes de vários programas de pós-graduação da Unifor. Uma quantidade significativa de projetos de pesquisa, nas diferentes áreas de enfrentamento à Covid-19, está sendo elaborada pelos professores pesquisadores da Unifor. Projetos que envolvem os aspectos epidemiológicos, patogênese, diagnóstico, monitoramento clínico e tratamento da doença, são alguns exemplos.