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Seg, 26 Setembro 2022 10:35

Entrevista Nota 10: Willer Cysne e a visibilidade da comunidade surda

Fundador do Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Cedef) e da Liga Nordestina Desportivo dos Surdos (LINEDS), o professor Willer Cysne compartilha sua trajetória como docente e ativista surdo no Ceará


Willer Cysne Prado é professor de Libras nos cursos de Educação Física, Fisioterapia, Fonoaudiologia e Direito da Unifor, além de ministrar a disciplina como optativa para outras graduações (Foto: Ares Soares)
Willer Cysne Prado é professor de Libras nos cursos de Educação Física, Fisioterapia, Fonoaudiologia e Direito da Unifor, além de ministrar a disciplina como optativa para outras graduações (Foto: Ares Soares)

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), cerca de 5% da população é surda. Esse número contabiliza mais de 10 milhões de pessoas que enfrentam dificuldades diárias no acesso a serviços básicos, mesmo sendo a Língua Brasileira de Sinais (Libras) uma comunicação oficial no Brasil. Tais barreiras de acessibilidade fazem com que campanhas como o Setembro Azul, mês de visibilidade da comunidade surda, sejam vitais para apoiar e lembrar das lutas desse grupo.

Willer Cysne Prado, por exemplo, não só faz parte dessa parcela da sociedade como também é um grande nome na luta pelos direitos dos surdos, em especial aqui no Ceará. Docente da Universidade de Fortaleza – instituição de ensino da Fundação Edson Queiroz –, ele é fundador e ex-presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Cedef) e da Liga Nordestina Desportiva dos Surdos (LINEDS).

Como professor, ele ministra a disciplina de Libras nos cursos da Unifor, além de participar do grupo de pesquisa “Processos e Práticas Educacionais Voltados à Inclusão”. Sua atuação focada em temas como inclusividade e educação vem da imersão de uma vida inteira – assim como do contato com a comunidade – em questões relacionadas à surdez.

Especialista em Gestão e Coordenação Escolar, Willer já foi diretor escolar do Instituto Cearense de Educação dos Surdos (ICES) e diretor regional da Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (FENEIS/CE), onde também foi instrutor de Libras. Seu legado na gestão de instituições ainda inclui um período na presidência da Associação dos Surdos do Ceará (ASCE).

Nos dias 26 a 28 de setembro, o docente irá participar da programação da Semana do Surdo, evento em alusão ao Dia Nacional do Surdo (26/09). Abertas ao público, as atividades acontecerão nos campi da Universidade de Fortaleza e da Universidade Federal do Ceará.

À Entrevista Nota 10 desta semana, Willer Cysne compartilha um pouco de sua trajetória como docente e do seu legado como ativista social dos direitos das pessoas surdas.

Confira na íntegra a seguir.

Entrevista Nota 10 – Como surgiu seu interesse pela docência? O que te fez decidir seguir a carreira de professor?

Willer Cysne – Surgiu quando aluno ainda. Na escola onde estudei, não havia nenhum professor surdo, e isso me incentivou a seguir a profissão de professor para que a comunidade surda pudesse ter professores surdos como referência. Assim, ingressei na faculdade de pedagogia. Decidi seguir carreira acadêmica justamente por conta da escassez de pessoas surdas altamente capazes nas faculdades.

Entrevista Nota 10 – Qual a importância do ensino da língua brasileira de sinais (Libras) no caminho para uma sociedade mais inclusiva?

Willer Cysne – Aprender Libras é fundamental para o desenvolvimento nos aspectos social e emocional não apenas do deficiente auditivo, mas também de todos que fazem parte do seu convívio. Aprender Libras faz parte do crescimento pessoal e profissional, visto que as pessoas com surdez podem encontrar menos barreiras comunicacionais, alcançando minimamente a inclusão.

Entrevista Nota 10 – De que forma a Universidade de Fortaleza trabalha no acolhimento às pessoas com deficiência (PCD)?

Willer Cysne – A Universidade tem se mostrado bastante efetiva em respeitar a diversidade que temos aqui. É notória a presença de alunos PCDs em sala de aula, com apoio necessário para que esse aluno consiga concluir seu curso. Temos o Programa de Apoio Psicopedagógico (PAP), onde tanto aluno como funcionário PCD recebem todo suporte de acolhimento.  

Entrevista Nota 10 – Em 2005, foi sancionado o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência (21 de setembro), com o objetivo conscientizar a população de que essas pessoas devem ter seus direitos respeitados. O que a comunidade PCD conseguiu conquistar ao longo dos anos junto aos governos nacionais e locais na busca por esses direitos?

Willer Cysne – As conquistas são inúmeras como atendimento prioritário, direito à reabilitação e, principalmente, acessibilidade. A gratuidade dos PCDs [no transporte público] também foi uma grande conquista, facilitando a mobilidade urbana para os atendimentos necessários.

Entrevista Nota 10 – Quais são os principais obstáculos na sociedade para alçarmos uma maior visibilidade às questões das pessoas com deficiência?

Willer Cysne – A barreira comunicacional é o principal obstáculo para o surdo. A Libras, quando não conhecida por parte dos ouvintes, acomete a exclusão. Principalmente quando se trata de assuntos bancários, onde a maioria das demandas requer atendimento via telefone, e o surdo, por sua vez, não consegue ser atendido. Quanto às demais deficiências, acredito que a principal barreira é arquitetônica e atitudinal das pessoas.

Entrevista Nota 10 – Acredita que esse cenário tem mudado com a popularização das redes sociais e o surgimento de influenciadores digitais PCDs trazendo luz sobre a causa para o público geral?

Willer Cysne – A tecnologia avançou, cresceu e, com ela, muitos recursos que facilitaram a vida das pessoas com deficiências. As redes sociais trouxeram visibilidade para esse público nas diversas esferas: arte, cultura, lazer, humor etc. Sem dúvidas trouxe, de forma positiva, muita luz.

Entrevista Nota 10 – Você é fundador do Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Cedef) e da Liga Nordestina Desportivo dos Surdos (LNDS), além de ter presidido diversas organizações voltadas ao universo PCD. Como você percebe o seu legado enquanto ativista pelos direitos das pessoas com deficiência, tanto a nível estadual quanto nacional?

Willer Cysne – Um legado que tenho a honra de carregar comigo, como líder da comunidade surda, são as muitas conquistas através de movimentos que galgamos, um caminho árduo e promissor. Alguns direitos conquistados enquanto estava à frente do Cedef, os movimentos, as demandas de palestras eram constantes – que, infelizmente hoje, diminuiu bastante por falta de verba destinada a essas lutas. A LNDS tem a sua importância, pois proporcionou encontros nacionais entre surdos-surdos, trazendo visibilidade para a comunidade ouvinte sobre os aspectos culturais inerentes aos surdos.