null Arte para todas as horas

Seg, 1 Março 2021 15:53

Arte para todas as horas

Aliada nos dias bons ou ruins, a Arte tem importante papel para quem quer fazer da vida uma jornada especial 


Diversos tipos de expressões artísticas atravessam a história da humanidade (Foto: Ares Soares)
Diversos tipos de expressões artísticas atravessam a história da humanidade (Foto: Ares Soares)

“Paradoxalmente, embora possa parecer, não é menos verdade que a vida imita a arte muito mais do que a arte imita a vida”, disse Oscar Wilde. A célebre reflexão do influente escritor, poeta e dramaturgo inglês, nos põe diante de uma pergunta atemporal: afinal, qual é o papel da Arte em nossas vidas? 

Refúgio para alguns, fonte de apreciação plena para outros, as Artes são dotadas de expressividades que produzem sensações, percepções e interpretações diversas em quem constrói conexão com elas, seja qual for o formato em que se apresentem. Isso porque as manifestações têm variedade de linguagens que abrangem emoções e ideias únicas. 

Bibliotecas da alma

De acordo com a professora Leonilha Lessa, gerente da Biblioteca Central da Universidade de Fortaleza, instituição da Fundação Edson Queiroz, em meio à pandemia de Covid-19, a Literatura desempenha importante função ao apaziguar as sensação de isolamento e solidão tão inseridas na nova realidade. “Os livros têm o poder de nos transportar para outros lugares, outros tempos, outras culturas, com este olhar, digo que uma boa leitura é capaz de nos livrar de muitos males que o isolamento social nos causa”, destaca. 

Para um novo tempo, novas formas de incentivar a leitura. É assim que a Biblioteca Central da Unifor tem se adaptado ao momento com o principal intuito de evitar aglomerações, mas sem deixar de presentear os apaixonados por conhecimento longe dos seus mais de 200 mil livros, entre clássicos da Literatura, obras contemporâneas e títulos destinados à pesquisa científica. A comunidade acadêmica agora conta com agendamentos via e-mail (bibemprestimo@unifor.br), por meio do qual é possível realizar empréstimos e devoluções. 

A Biblioteca continua muito ativa e a distância não impede de estarmos sempre próximos à comunidade acadêmica. Estamos preparando uma acolhida para 2021.1 para nossos alunos, onde serão apresentados os serviços da biblioteca, será entregue declaração de participação e sorteio de brindes”, pontua Leonilha Lessa.

A arte do cordel, reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro tem lugar cativo na Biblioteca da Unifor com a Cordelteca Maria das Neves Baptista Pimentel, que homenageia a primeira mulher a publicar um folheto do gênero, no ano de 1938. A Cordelteca Unifor é a primeira dentro de uma instituição de ensino superior, em Fortaleza, a catalogar, indexar, e organizar com cuidados especiais os folhetos de cordéis, que são frágeis por suas características físicas, objetivando a sua maior preservação. O acervo soma 1.606 mil títulos, no total 3.173 exemplares localizados na Biblioteca.

Para quem aprecia literatura brasileira e deseja imergir na história de uma das mais importantes vozes de todos os tempos nesta vertente, a Biblioteca Central possui também a Coleção Rachel de Queiroz. Formada por 3.100 itens do acervo bibliográfico da ilustre escritora cearense, a iniciativa permite o acesso dos cearenses a um acervo de valor histórico inestimável e de grande relevância para a pesquisa e preservação da literatura nacional. “Temos uma sala ambientada, com carinho e zelo, para receber todos os interessados neste ícone da literatura brasileira. No momento a sala está indisponível, por conta da pandemia, mas logo que tudo isto acabe é um espaço cultural que não pode deixar de ser visitado”, afirma Leonilha Lessa com otimismo. 

+ Confira AQUI uma lista de livros especiais indicados pela Biblioteca da Unifor.
+ Conheça o Blog da Biblioteca da Unifor

Passeio pela História 

“Don Quixote de la Mancha” ilustrado por Salvador Dalí, coleção “Os Sertões” com sua primeira edição, e “Opere Varie di Architettura”, de Giovanni-Batista Piranesi, maior gravurista do século XVII. Uma pequena amostra do verdadeiro deleite cultural e histórico firmado em obras raras presentes na Biblioteca Acervos Especiais da Unifor

Títulos que propõem a revisitação dos séculos XV ao XVIII, uma viagem no tempo guiada por cerca de 9 mil volumes nas áreas das Artes, Literatura, História, Direito, Pareceres Jurídicos e Manuscritos, ilustrações originais de artistas nacionais e estrangeiros. 

Para Ana Wanessa Bastos, bibliotecária responsável pelos Acervos, “as bibliotecas mantêm coleções que podem ajudar a sociedade a acessar valores educacionais, sociais, científicos e artísticos do patrimônio documental e se conectar ao passado, também neste período pandêmico, em que muitos de nós anseiam por conexão”, destaca. 

E neste cenário de distanciamento, os livros também despertam a reinvenção dos espaços físicos que habitam. Foi assim que surgiu a ideia de levar o Acervo até o público, com posts especiais nas mídias sociais da Universidade e visita guiada em modelo remoto com o intuito de expor e discutir as obras. 

Para além de tudo isso, o cuidado e o afeto pela arte literária guiam a preservação de tantas obras raras e notáveis. “Nos meses de quarentena e lockdown, além da suspensão das visitas, uma das ações primordiais desse espaço foi criar formas de monitorar e manter os cuidados com as instalações do ambiente para a salvaguarda do acervo. Isto se dá pela importância das coleções de livros raros e especiais nesta biblioteca, estas têm valor patrimonial de cunho artístico, científico, histórico e cultural, além de potencial de gerar novas pesquisas”, relembra Ana Wanessa. 

Entre as diversas obras, é possível destacar a coleção Brasiliana, com livros que tratam sobre o Brasil pela perspectiva de viajantes dos séculos XVI ao XIX, além da História Colonial e Imperial do Brasil, que conta com obras como “Geschichte in Brasilien” (Maurício de Nassau) de Gaspar Barleus (1659) e “Voyage pittoresque et historique au brésil” de Debret (1834/1835/1839). Há também o incunábulo Quadragesimale Gritsch Una, um livro de 1489 de Johannes Gritsch; a coleção da Sociedade dos Cem Bibliófilos, com clássicos da literatura brasileira e com gravuras originais de grandes artistas do Brasil. 

“Acrescenta-se, a existência do acervo e sua ação enquanto instrumento cultural voltado para a história cearense, diante da preservação de obras de autores do estado, o que viabiliza aos visitantes locais e estrangeiros o conhecimento a respeito destes. Assim como disse Bauman [sociólogo e filósofo polonês]: ‘quando pensarmos em livros, vamos pensar primeiro em sociedade. Quando nos preocuparmos com o futuro dos livros, vamos olhar mais de perto para a sociedade e suas tendências’”, a bibliotecária deixa a reflexão. 

Uma galeria de tod@s

A arte restrita a uma pequena parcela erudita da população. Sinônimo de um Brasil que, desde 1988, com as iniciativas do Espaço Cultural Unifor, se desconstrói cotidianamente. Isso porque a missão do Espaço é, sobretudo, promover a inclusão por meio da disseminação das artes plásticas, com acesso gratuito à exposições, o que fortalece a renovação e democratização do conhecimento das identidades artísticas, históricas e culturais do país. 

À frente da gestão deste importante instrumento, reconhecido como Patrimônio Turístico de Fortaleza (2016), uma presença sensível e atenta às transformações. Assim, a professora Adriana Helena conduz a transmissão do legado de tantos artistas que assinam as mostras. “A arte produz novas formas de ver e pensar a vida, ela é uma transformação da realidade”, declara ela. 

Durante a pandemia de Covid-19, o Espaço Cultural rompeu as barreiras físicas e apostou nas experiências virtualizadas com o público de forma bem sucedida. As visitas virtuais e interações continuarão. “Para as novas exposições, vamos possibilitar visitas mediadas para as escolas por meio das plataformas digitais e outras ações que possibilitem uma maior abrangência virtual como ferramenta de democratizar cada vez mais esse acervo”, adianta a gestora do Acervo da Fundação Edson Queiroz. 

O espaço, que já abrigou exposições exclusivas nacionais e internacionais, como Rembrandt, Candido Portinari, Miró, Beatriz Milhazes, Antonio Bandeira, Vik Muniz e Burle Marx, além do destaque à arte regional, se consolida com referência na valorização da riqueza e da diversidade cultural. 

“Desde 1988, ano de sua inauguração, o Espaço sempre teve como essência ampliar o campo da percepção e da fruição estética, além de promover e projetar sucessivas gerações de artistas cearenses, nacionais e internacionais, revelando-se como uma expressiva referência de elaboração e de divulgação das artes visuais contemporâneas brasileiras. Destaca-se como um espaço relevante que contribui para a formação do público, a democratização das artes, bem como a possibilidade de despertar o olhar para arte e ampliar o senso crítico”, frisa Adriana Helena. 

Com a chegada de 2021, as novidades prometem conquistar novos olhares do público. Já em março serão lançadas as exposições: “50 Duetos”, que conta com a curadoria de Denise Mattar e celebra os 50 anos da Fundação Edson Queiroz, e “Águas de Março”, maior exposição do artista cearense Sérgio Helle. Para o segundo semestre, a tradicional Unifor Plástica dá destaque ao trabalho de artistas nascidos ou radicados no Ceará. 

Cinema para sonhar e refletir

O poder da sétima arte e seus encantos. Da tela às sensações, o Cinema conquista os mais diversos públicos com suas narrativas singulares. Durante a primeira onda da pandemia de Covid-19, o Audiovisual ganhou espaço nos lares ao redor do mundo. Em larga escala, as plataformas de streaming, por exemplo, disponibilizavam suas produções, uma companhia e tanto para amenizar os dias de isolamento. 

O cinema foi um grande refúgio para aqueles que tiveram o privilégio de ficar em casa. A pandemia aprofundou a centralidade da imagem na experiência social contemporânea. Nunca o mundo consumiu tanto cinema, tantas histórias. Infelizmente, num cenário de tragédia mundial”, observa a professora Bete Jaguaribe, coordenadora do curso de Cinema e Audiovisual da Unifor. 

Com as mudanças desencadeadas pela pandemia, cineastas e público se veem diante de muitos desafios. Para uns, a busca por soluções possíveis de viabilizar seu trabalho. Para outros, a saudade da experiência coletiva ao sair da bilheteria e admirar um mundo inventivo e ampliado, direto da sala de cinema. 

“No ambiente da pandemia, o realizador precisa lidar com uma série de imposições objetivas dos protocolos, como distanciamento e uso de máscaras. Com os lockdowns que esvaziam os cinemas, afastando os públicos, com a instabilidade econômica, e com as próprias sensibilidades das equipes, afetadas pela insegurança do momento. As práticas dos set de filmagens estão num momento de profundas transformações. Uma arte que se faz em grupo, de forma coletiva, experimenta, nesse momento, um grande desafio”, enfatiza Bete Jaguaribe. 

Como toda arte que resiste e se reinventa, o Cinema também teve seu potencial ativado pelas dificuldades. Do imaginário à realização, profissionais da área exploram a criatividade e continuam a dar forma a uma das expressões artísticas mais importantes da humanidade. 

Segundo Bete Jaguaribe, “nos momentos de profundas crises, a criação artística reage com uma potência estética extraordinária, contribuindo imensamente para a compreensão da experiência humana. A história da arte é pontuada desses momentos de intensa invenção artística, de experimentação de linguagens. As grandes vanguardas emergiram no ambiente de crise mundial, como os modernismos dos anos de 1920, por exemplo, que foram movidos diretamente pela crise pós Primeira Guerra Mundial. Agora, estamos vivendo uma tragédia mundial, que se apresenta muito mais séria em países dirigidos por negacionistas. O que resta à arte? O que resta ao cinema? Se fazer existir, apesar de tudo: com invenções, novos modelos de produção. Ao mesmo tempo que a crise ameaça, também traz uma certa liberdade de risco, considerando que a tragédia, por si mesma, já impõe uma instabilidade muito radical”, destaca. 
 
E os cineastas em formação, como ficam em meio às transformações? Na Universidade de Fortaleza, os estudantes de Cinema e Audiovisual realizam filmes desde o primeiro semestre do curso. Na pandemia, eles puderam experimentar novas possibilidades. Dois projetos estimularam essa jornada: a Mostra Cenas de Quarentena, já em segunda edição, que mobiliza os alunos a fazerem vídeos no ambiente de isolamento, e a Mostra Unifor de Cinema de Arquivo, em que os alunos fizeram filmes com imagens da internet. 

Para Bete Jaguaribe, tantas novidades reiteram a vitalidade de uma arte que atravessa gerações. Ela indica, inclusive, assistir ao filme “Terra em Transe”, de 1964. “É dirigido por Glauber Rocha, nosso mais genial cineasta. É um filme que nos ajuda a entender o Brasil contemporâneo”, deixa a sugestão.