null O que você aprendeu com esse ano que passou?

Qua, 23 Dezembro 2020 11:47

O que você aprendeu com esse ano que passou?

Docentes e graduandos da Universidade de Fortaleza relatam experiências e reflexões vivenciadas em 2020.


"Fortaleci minha fé e aprendi a valorizar ainda mais a vida", conta a docente Márcia Marinheiro em depoimento para esta matéria. (Foto: Acervo pessoal)

O ano de 2020 foi repleto de desafios e transformações para muitas pessoas. A pandemia de Covid-19 provocou isolamento social e modificações na rotina de toda a sociedade, impactando a cada um de forma distinta e singular. Docentes e graduandos da Universidade de Fortaleza, instituição de ensino da Fundação Edson Queiroz, relembram as experiências, reflexões e aprendizados vivenciados durante esse ano. Confira a seguir.
 

Charleston Vieira, professor do curso de Fonoaudiologia da Unifor. (Foto: Arquivo pessoal)

Mudanças emocionais e a sabedoria em recomeçar

Ao final de 2019, o falecimento de sua mãe marcou o início do ano de 2020 para Charleston Vieira, professor do curso de Fonoaudiologia da Universidade de Fortaleza. “Foi um grande impacto para o começo de um ano. Minha mãe faleceu no dia do meu aniversário, em dezembro de 2019. Já comecei o ano em luto e tentando organizar minha cabeça para o que viria depois”, comenta ele.

Com o início da pandemia, o professor viu-se em casa e iniciou um processo de autodescoberta em vários setores da sua vida pessoal e profissional. “Fui me remodelando pessoalmente, voltando os olhos para a minha casa. E também profissionalmente, pois estávamos todos virando uma chave para transformar o que é presencial para o virtual. Até hoje, existe esse momento de aprender a ficar mais sozinho, a ser mais seletivo em tudo o que realizo. Tanto na alimentação, amizades e na maneira em que faço minhas escolhas. Comecei a cuidar do meu corpo, a fazer atividades físicas e passei a praticar Yoga, algo que não me imaginava fazendo. Meus colegas de profissão falam que estou melhor, diferente”, conta ele.

Em sua vida profissional, Charleston encontrou novos significados. “Como sou do curso de Fonoaudiologia, a gente prima pela interação social, pois comunicar não é só falar, é fazer com que o outro se transforme e nos transforme também. É um movimento de transformação e tínhamos que fazer isso dando aula por meio de videoconferência. É uma nova significação tudo isso. Eu possuo um consultório e não me sentia confortável nos atendimentos que envolviam o uso da respiração e alongamentos corporais, pois requerem um contato físico maior. Então, encontrei na Telefonoaudiologia uma alternativa para continuar realizando os atendimentos de modo remoto, ao invés do presencial”, relata.

Entretanto, as mudanças emocionais continuaram ao longo do ano para o professor. Em maio de 2020, seu pai faleceu e, no dia seguinte, nasceu o seu primeiro sobrinho neto. “Imagine a montanha russa de questões pessoais, que envolvem a morte e o nascimento. Foi um ano de muitas mudanças emocionais, por conta da perda dos meus pais, e isso me deu uma nova visão do que seria viver e ver o mundo”, completa.

Para o docente, ficar em casa foi uma oportunidade para olhar para dentro de si mesmo. “E para vida que eu estava levando. Sempre tive uma vida tranquila, mas o resgate foi necessário. Foi possível avançar na minha vida profissional, aprender a ver ao longe e saber que isso não tem volta. Tudo o que foi modificado vai ser para sempre. Pude cultivar a esperança de que amanhã vai ser um novo dia e estar fortalecido para o que virá”, enfatiza ele.

Márcia Marinheiro, docente do curso de Medicina da Unifor. (Foto: Arquivo pessoal)

Resiliência e ressignificação

Para a professora Márcia Marinheiro, do curso de Medicina da Universidade de Fortaleza, 2020 foi um ano desafiador em todos os sentidos. “Começou com muitos planos e projetos pessoais e profissionais. De repente, tivemos a nossa liberdade cerceada por um vírus. Ficar longe da família, participar da linha de frente quando todos deveriam ficar em casa protegidos e protegendo os seus. Não foi tarefa fácil lidar com um inimigo desconhecido, uma ameaça iminente, o medo dos pacientes e próprios profissionais da saúde”, relata ela.

A professora relembra o período de aprendizado do ensino a distância. “Novas metodologias me fazendo estar perto dos alunos, mesmo estando separada fisicamente. Foi necessário ter empatia e cuidado para adentrar à casa e, às vezes, na vida do outro. Durante o ano que passou, precisamos nos reinventar em um esforço coletivo e evoluímos juntos”, completa Márcia.

Em virtude do desgaste emocional existente, a professora conta ter se reaproximado da arte e da leitura. “Em determinado momento, percebi que o desgaste emocional de colegas da área da saúde, familiares, alunos e amigos pedia atenção: o mundo pedia atenção. Acostumados à socialização, ao abraço, esse período de isolamento por si só inspirava cuidados. Resgatei a leitura, foi o ano que mais li e levei poesia e leveza a partir das redes sociais. Fortaleci minha fé e aprendi a valorizar ainda mais a vida, as pequenas coisas, os detalhes, o agora”, destaca.

 Eduarda Castro, graduanda em Jornalismo da Unifor. (Foto: Arquivo pessoal)

Aproveitar a própria companhia e novas distrações

Para Eduarda Castro, graduanda em Jornalismo na Universidade de Fortaleza, o ano de 2020 foi um período repleto de aprendizados sobre aproveitar a própria companhia. “Aprendi a fazer coisas novas, sem precisar envolver outras pessoas. Conheci muitos conteúdos bacanas, pois passei a consumir mais vídeos, músicas, filmes e livros durante o período da pandemia. Aprendi também a valorizar mais o meu lar”, comenta.

Durante a pandemia, a aluna relembra que conseguiu manter a rotina de estudos mesmo em casa. “Aproveitei a oportunidade para voltar para a casa da minha mãe, não senti muito incômodo em ficar em casa. Fiquei tão acostumada com essa realidade, que tive um pouco de dificuldade de retomar à vida presencial, ainda que fosse aos poucos. Sair de casa, pegar ônibus, ir à faculdade ou local de trabalho, me deu um pouco de ansiedade e estranhamento no início”, completa ela.

 Normanda Araújo, docente do curso de Psicologia da Unifor. (Foto: Ares Soares)

Alívio de saber-se vivo(a), mas não sem marcas

Docente do curso de Psicologia da Universidade de Fortaleza, Normanda Araújo é também pesquisadora e orientadora. Para ela, o ano foi exigente. “Como permanecer indiferente diante de tantas mortes? Diante de tantas pessoas adoecendo e da desigualdade que marcou a vivência de tantas(os)? Poder continuar trabalhando na segurança da minha casa, com minha família, foi um privilégio. No entanto, conciliar a rotina de cuidados de um filho de dois anos e tarefas domésticas com home office, foi física e emocionalmente cansativo”, comenta ela.

Além disso, a professora comenta sobre a exigência existente para que prazos e qualidade de trabalho continuassem a existir. “Fazer isso em um estado de exceção, certamente não foi fácil. Implicou rever metas, prazos, redefinir projetos. Gerou um cansaço emocional, sinto-me como um soldado que lutou em uma guerra. Há um alívio de saber-me viva, mas não sem marcas”, ressalta.

Dentre suas principais experiências pessoais, Normanda enfatiza sobre reconhecer-se pequena(o), frágil. “As lições aprendidas são muitas. Ao mesmo tempo, sinto a necessidade em agradecer pelo imenso privilégio de poder viver tudo junto a minha família, partilhando cada um dos desafios. Outro importante aprendizado que levo comigo, diz respeito à importância do conhecimento e dos laços de afeto ao longo do ano. No nosso grupo de pesquisa, passamos imediatamente a estudar artigos que tinham a pandemia e seus impactos como foco. Falar sobre isso semanalmente agregou conhecimento, mas também abriu um espaço de partilha sobre nossos sentimentos e experiências pessoais”, relata ela.

Hoje, a professora olha para trás com gratidão e pesar. “Agora, olhar tudo isso e fazer memória, gera um sentimento de gratidão, e ao mesmo tempo, pesar por aqueles que não estão mais aqui. Em um tempo que fomos chamados a estar mais distantes fisicamente, a importância dos outros naquilo que somos fez-se ainda mais clara. Gratidão e compromisso com o outro parecem ser a síntese do aprendizado que levarei comigo”, finaliza.

Beatriz Chaves, discente em Psicologia da Unifor. (Foto: Arquivo pessoal)

Anseio para viver intensamente

Graduanda em Psicologia na Universidade de Fortaleza, Beatriz Chaves conta que 2020 foi um ano decisivo para seu autoconhecimento. “Foi um ano desafiador, me senti em uma montanha russa de sentimentos. Angústia, felicidade, tristeza, raiva, euforia, uma mistura de sentimentos em um curto período de tempo. Acredito que o anseio em querer viver intensamente me alimentou neste período de pandemia, e por isso me permiti viver e desafiar mais. Fico muito orgulhosa de todo o progresso pessoal que tive durante esse tempo”, ressalta ela.

A aluna conta ter começado a entender melhor os seus limites e ter coragem para experimentar coisas novas. “Valorizar a minha saúde, minha família e meus amigos. É impossível me definir nesse período pandêmico em um só sentimento. Eu vivi todos e aproveitei da melhor forma possível”, completa.

Para Beatriz, apesar das dificuldades vivenciadas durante o ano, é importante reconhecer o valor da união. “Aprendi muito sobre valorizar e apreciar os momentos. Viver o presente. Aprendi a valorizar a união, em todos os aspectos, tanto na faculdade, quanto na vida pessoal, todos estávamos unidos. O olhar empático com o outro foi o que mais se fortaleceu nesse período. Essa união me fez continuar mesmo com todas as dificuldades, e isso foi o que mais aprendi esse ano: juntos somos mais fortes”, enfatiza ela.