null Entenda projeto de lei que visa regulamentar direitos de motoristas de aplicativos no Brasil

Seg, 22 Abril 2024 17:51

Entenda projeto de lei que visa regulamentar direitos de motoristas de aplicativos no Brasil

Proposta do Governo inclui contribuição para previdência e auxílio-maternidade


Dados do IBGE mostram que, em 2022, o Brasil tinha 1,5 milhão de motoristas prestando serviços para as plataformas digitais e aplicativos (Foto: Getty Images)
Dados do IBGE mostram que, em 2022, o Brasil tinha 1,5 milhão de motoristas prestando serviços para as plataformas digitais e aplicativos (Foto: Getty Images)

O panorama do trabalho de motorista por intermédio de aplicativos tem sido objeto de intenso debate no Brasil nos últimos anos. Nesse contexto, o Projeto de Lei Complementar (PLP) 12/24 surge como uma tentativa de regulamentar a atividade de profissionais que atuam por meio de plataformas digitais no país. A ideia dele é estabelecer direitos e deveres tanto para trabalhadores quanto para as empresas envolvidas.

Principais pontos do projeto de lei

Entre os tópicos abordados pelo documento, estão a redução de riscos inerentes ao trabalho, a eliminação de formas de assédio, o direito à sindicalização, entre outros. Segundo João Marcelo Rego Magalhães, docente do curso de Direito da Universidade de Fortaleza — mantida pela Fundação Edson Queiroz —, os principais pontos são:

  • Cobertura de custos
    Para cada hora efetivamente trabalhada, será pago um valor de R$24,07/hora, destinado a cobrir os custos de utilização do celular, combustível, manutenção do veículo, seguro, impostos etc. Esse valor é indenizatório e não compõe a remuneração.
  • Previdência
    Os trabalhadores e trabalhadoras serão inscritos obrigatoriamente no Regime Geral da Previdência Social (RGPS), com regras específicas para o recolhimento da contribuição de cada parte (empregados e empregadores).
  • Auxílio-maternidade
    As mulheres trabalhadoras terão acesso aos direitos previdenciários previstos para os trabalhadores segurados do INSS.
  • Acordo coletivo tripartite
    O trabalhador em aplicativo será representado por entidade sindical da categoria profissional “motorista de aplicativo de veículo de quatro rodas”. As entidades sindicais terão como atribuições: negociação coletiva; celebração de acordo e convenção coletiva e representação coletiva dos trabalhadores nas demandas judiciais e extrajudiciais de interesse da categoria.

Outras mudanças

Além disso, os motoristas não poderão ficar conectados à mesma plataforma por mais de 12 horas no dia e terão uma remuneração mínima proporcional ao salário-mínimo, atualmente R$1.412. O projeto impede ainda que as empresas limitem as viagens do trabalhador que alcançar esse valor.


Projeto sugere que trabalhadores contribuam com alíquota de 7,5% ao INSS (Foto: Getty Images)

A transparência entre empresa e empregado também foi contemplada no PL, que determina que o motorista terá acesso a um relatório mensal, onde constarão informações sobre parâmetros que compõem o valor da remuneração, dados sobre critérios de oferta de viagens, pontuação, bloqueio, suspensão e exclusão da plataforma.

Os empregadores irão recolher 20% sobre os valores referentes à remuneração (que compõe 25% da hora paga, ou seja, R$8,02/hora). O desconto deve ser repassado pelas empresas para a Previdência Social, juntamente com a contribuição patronal.

Críticas ao projeto

Doutor e mestre em Direito Constitucional, o advogado público federal João Marcelo explica que o PLP 12/24 tem sido alvo de críticas, especialmente por parte das empresas intermediadoras de transporte por aplicativo. 

Elas contestam a caracterização proposta pelo projeto, argumentando que são empresas de tecnologia e não empregadoras diretas dos motoristas. Ainda alegam que as novas obrigações poderiam inviabilizar as operações ou aumentar significativamente os custos para os usuários. Para o professor de Direito Administrativo, o projeto não atinge o centro do problema, que é o desvirtuamento do conceito de economia compartilhada

“Tínhamos a possibilidade de pessoas usarem a parte ociosa dos seus bens, como casas e carros. Então, surgiu a ideia da economia compartilhada. Mas isso virou um novo ramo de negócios, porque as pessoas que estavam desempregadas viram aí a possibilidade não de utilizar o carro ocioso, mas de comprar um carro para isso”, analisa João Marcelo.

Muitas das empresas, que se diziam apenas intermediadoras, incentivaram a compra de carros, o que transformou uma ideia inicial de uso racional dos bens em uma ideia de negócio comum.


“Não está correto dizer que os motoristas são subordinados às empresas. Assim como não está correto dizer também que eles são autônomos, porque eles têm uma série de obrigações mínimas para com a empresa. Então, na verdade, o projeto não enxerga a questão de fundo da coisa, da economia compartilhada e da economia por aplicativo, das corridas por aplicativo, que é um negócio novo, uma situação nova”João Marcelo Rego, professor de Direito Administrativo na Unifor e advogado público federal

Nova categoria de trabalhadores 

O docente acredita que uma das falhas do projeto é não contemplar a questão central do problema: a existência de uma nova categoria de trabalhadores, que nem são autônomos nem são subordinados. Nesse sentido, o João Marcelo pontua que, para garantir o mínimo de direito a esses trabalhadores, seria necessário que a iniciativa partisse das empresas.

“Toda regulamentação governamental vai gerar incentivos que podem ser perversos. Se, por exemplo, eu tenho um mínimo de horas pelo fato de trabalhar num aplicativo e me cadastro em várias plataformas, então eu vou ter vários salários mínimos? Se eu me cadastrar em três plataformas, terei três salários mínimos? Quanto eu preciso trabalhar para ganhar esse mínimo? Eu vou ganhar esse mínimo só por estar cadastrado?”, questiona o jurista.

Por fim, ele ressalta a dificuldade de realizar essa fiscalização e pondera que esse é o tipo de mercado que depende do Estado “sentar junto” com as empresas e fazer uma espécie de autorregulação guiada pelo governo

“O governo diz quais são os pontos em que ele entende essenciais e a partir daí as empresas fazem uma proposta de autorregulação. Sem que as empresas participem desse rol de direitos, muito provavelmente o projeto não vai gerar o resultado que o governo espera”, conclui.

Quer estudar Direito?

O curso de Direito da Unifor é reconhecido pela sua excelência, com a nota máxima (5) na avaliação do Ministério da Educação. Oferece uma formação humanista com foco na ética, responsabilidade social e fortalecimento dos valores constitucionais, preparando o aluno para o exercício profissional nos mais diversos campos de atuação.